sábado, 16 de abril de 2016

the grim within

acho que a maioria das pessoas que me conhecem e/ou convivem comigo deve saber que eu sofro de depressão e ansiedade. eu não faço questão de esconder isso de ninguém, pra ser sincera eu quero mais é que todo mundo saiba e não pense de cara que eu sou tão extrovertida por dentro quanto sou por fora. o que muitas pessoas ainda não sabem é como se convive com essas duas doenças, ambas incapacitantes e, por vezes, debilitantes.
tudo começa na sua criação, que eu nem vou entrar em detalhes porque ninguém merece ver um disclaimer sobre quão fucked up é instruir sua criança a ser a melhor em tudo por meio de pressioná-la até que em um certo ponto da vida ela se fode toda tentando atingir seus próprios padrões de excelência e não consegue, descobrindo que é uma pessoa average. average pra caralho.
na puberdade e início da adolescência eu percebi que estar triste era algo contínuo pra mim, tão normal quanto qualquer outra coisa que eu fizesse. as causas, bem, só eu sei, e prefiro não me estender sobre porque isso envolve outras pessoas que podem não gostar de saber que eu sei que o que eles fizeram não foi bom pra mim. nesse meio tempo, até meus 17 anos, eu tentei me matar 15 vezes. sim, isso mesmo. simplesmente porque às vezes eu não sentia como se a vida me preparasse alguma coisa boa ou que fizesse o sofrimento de viver valer a pena.
na adolescência, quando comecei a ter responsabilidades e relacionamentos mais profundos com as pessoas, vendo que tudo que eu fazia só me machucava de um jeito ou de outro, eu procurava escapar das situações reais vivendo em mundos fictícios (livros e jogos). pra aliviar minha ansiedade, eu tentava me isolar de tudo que eu tinha que fazer e evitava pensar nas coisas que querendo ou não iriam me dar mais uma crise de ansiedade. a pior delas foi prestes a começar os vestibulares. você simplesmente não consegue evitar de pensar em todas as possibilidades que sua vida possa trazer, sejam elas boas ou ruins. e nisso eu me prendia por horas, até me dar conta que não conseguia fazer o que deveria fazer porque eu ficava em crise deitada na cama sem conseguir me mexer pensando em como seria o futuro. mas não é simplesmente pensar no futuro, como qualquer pessoa normal: é pensar obsessivamente, a ponto de te incapacitar de fazer qualquer coisa, te imobilizar, te prender naquela posição e só te libertar quando seu cérebro cansar de se esgotar e pedir redenção.
sendo uma pessoa sensível demais, tudo que acontecia na minha vida parecia me afetar mais do que deveria, então qualquer coisa era capaz de me deixar mal e sem esperança. a minha impressão torpe sobre todas as outras pessoas do universo é que elas não prestam e que depois da intimidade elas impreterivelmente vão fazer alguma coisa que me machuque, que isso é só questão de tempo. paranoia? sei lá, talvez só ceticismo. nisso, eu tinha crises depressivas absurdas, eu ia pra escola igual um zumbi e minha única vontade era voltar pro conforto do meu quarto pra poder sofrer em paz. durante o período da faculdade, sair de casa era um sacrifício, literalmente, porque eu voltava pra república e chorava horrores.
eu não me sinto à vontade perto de outras pessoas, especialmente quando você tá numa descida na montanha russa emocional. eu sempre acho que elas estão me julgando, que eu sou inapropriada pra todos os tipos de ocasiões, que as pessoas me acham idiota, babaca e desprezível. nisso, ou eu tento fazer uma boa imagem de mim mesma ou eu simplesmente meto o foda-se e depois fico remoendo as possíveis deduções das pessoas com quem tive contato. em momentos mais críticos da depressão, a presença de outras pessoas não só me deixava extremamente confortável como também me dava sintomas físicos de pânico, como suar frio, falta de ar, taquicardia, etc.
basicamente a gente sai de casa pra se desesperar, volta pra casa pra se desesperar. quando você tá em crise, não tem escapatória, a não ser que você tire a motivação de dentro do seu......... coração e consiga subverter sua crise. isso só acontece depois de algum tempo sofrendo, pra ser honesta. quando você volta a se recuperar, a ficar bem, mesmo nesses momentos onde supostamente você deveria se sentir melhor, feliz, energizado, bem, a realidade não é assim. a gente sabe que é temporário, a gente sabe que depois de uma grande subida tem uma grande queda e ao invés de aproveitar o que tem de legal nesses momentos de subida, a gente fica pensando obsessivamente sobre a próxima queda. até que a gente cai, certo? "mas todo mundo tem altos e baixos na vida, isso não é justificativa pra depressão" a diferença é que as pessoas que não sofrem de doença alguma não vão sentir tanto quanto um depressivo, que tem lidado a vida inteira com a merda que é estar preso na própria mente. não vale nem a pena comparar, pra ser sincera.
"vocês gostam de se vitimizar e se sentem especiais por isso" sim, eu adorei ter nascido assim. é um puta orgulho do caralho me sentir um lixo todo dia e acordar querendo morrer. é literalmente tudo que eu sempre sonhei pra minha vida: uma doença que me incapacita de viver direito, que me prende em coisas absurdas e idiotas que nem mereciam minha atenção, saber que vai ser assim pra sempre e de quebra me sentir pior ainda por ser fraca demais pra sair disso de vez, como se houvesse essa possibilidade.
talvez a pior parte da depressão seja a área cinza. você não se sente nem feliz, nem triste. você não sente nada. todos os seus prazeres lhe passam despercebidos, todas as decepções também. você simplesmente não sente nada. n a d a. é um vazio, um vazio imenso, uma vontade de morrer misturada com o sentimento de não estar nem tão mal assim pra desejar isso. é horrível. sempre sucede a grande subida ou a grande queda. você não tem energia, não tem disposição e não tem esperança... você simplesmente vai e faz as coisas pela conveniência da obrigação e porque você não pode morrer de fome, mas de resto... nada... a sua única esperança é ainda ter uma única esperança pra poder se segurar na vida.
a melhor característica da pessoa deprimida (diferente da suicida) é que ela é perseverante. ela passa a vida inteira esperando algo legal acontecer... aí de repente morre. no fim das contas a gente fica só esperando o alívio da morte pra acabar com a espera. a não ser que você tome remédios, tenha uma rotina legal, tenha disposição e tudo mais, você acaba sem energia, vontade ou motivação de fazer qualquer coisa grande na sua vida. você quer, mas você acha que não consegue. quando você consegue algo, by chance, você começa a perceber que nada vale a pena. nem mesmo o sucesso. que todos os prazeres são passageiros e ínfimos perto de um único relance de paz mental. dispender tempo pra quê? pra depois se dar conta que foi só um outro desperdício dentre o maior, que é a sua própria vida? é, eu imaginei.
não é nem como se odiasse a vida, simplesmente não vejo sentido nela. não vejo sentido em fazer nada. eu faço pela conveniência e porque alguns objetivos talvez tragam uma situação melhor pra mim e me façam sentir melhor caso alcançados. como eu disse, é persistência. pura e simplesmente. você fica lá batendo na tecla que é viver, overthinking tudo que puder, com as suas paranoias e decepções constantes, até você morrer e, lá do além, quem sabe, se dar conta que definitivamente não valeu a pena.


ps: escrevi sem revisar
ps2: to realmente cagando pras consequências do post scriptum acima

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2016

uma engenheira química que nunca será

eu havia decidido, há algum tempo, não falar sobre isso. simplesmente deixar evaporar o meu ano de 2015. o motivo da minha omissão para com as pessoas que poderiam (ou não) se interessar pelo que aconteceu em lorena no ano passado foi o trauma que eu passei em falhar grandemente na maioria dos aspectos da minha vida. pois, veja, se você me conhece há algum tempo, deve ter uma ideia de que eu era a pessoa que sempre se dava bem em tudo. achei que me daria bem no que era o meu suposto sonho, mas foi muito pior que isso. mil vezes.
no começo, bem, a excitação de ter passado na melhor universidade da américa latina (sic) superava qualquer insegurança. o êxtase de finalmente ter saído da casa de minha mãe e ter a oportunidade de ser independente estava acima de qualquer coisa. eu fiz bastante merda nesse tempo também, não vou mentir. coisas das quais eu não exatamente me arrependo, mas das quais eu me lamento bastante... 
a falta de responsabilidade no primeiro semestre em que eu baguncei minha vida acadêmica, emocional, minha saúde... não sei dizer se foi pelo torpor da alegria de estar lá ou se foi para justamente esquecer que eu estava lá. que eu tinha que fazer coisas. que eu tinha que ser responsável. que eu tinha que assumir todas as minhas falhas. 
não sei se é plausível falar das ~merdas~ que eu fiz, mas digamos que não foram escolhas muito prudentes de curtir o que eu tava passando no momento. gastei muito dinheiro sem pensar, me atraí por pessoas que eu poderia simplesmente desconsiderar e não aproveitei os momentos bons como poderia. na verdade, depois de qualquer interação social proveniente da faculdade, sempre me vinha na cabeça o pensamento de quão vago e superficial era tudo aquilo. as festas, as bebidas, as pessoas que você não conhece mas com quem você tem contato just because. aquilo tudo, depois de feito, me irritava e me deprimia como nada nesse mundo deveria.
as aulas eram extremamente maçantes, eu mal tinha paciência pra ficar lá dentro. a pior parte de lembrar que as aulas eram um saco é o fato de que elas eram o principal motivo de eu estar lá e eu simplesmente não conseguia suportá-las. a princípio eu achei que a usp fosse a melhor coisa que poderia ter acontecido na minha vida, pois ela me livrou de todo o estresse de morar onde eu morava e de ter de me preocupar com meu futuro. o problema foi que ela criou em mim desmotivação e desilusão incomparáveis.
vou me ater ao que eu vivi e ao que eu senti: engenharia é uma coisa chata. não apenas chata, é monótona, é robotizada, é intelectualmente massacrante. especialmente o ciclo básico, onde ou você tem o mesmo raciocínio que todo mundo ou você roda. eu, autodidata e claramente confusa pra caramba, rodei. rodei bonito. rodei até nas coisas que eu mais gostava. rodei nas coisas que eu achava que fosse realmente boa. depois de dar com a cara no chão eu percebi por que eu não me dava com o curso: eu não conseguia seguir o pensamento inflexível dos professores. óbvio que não eram todos, mas pelo menos os que eu tinha eram boas demonstrações de arcadismo.
não tendo me identificado com o curso, minha vida social bagunçada e a amorosa um cocô (não entro em detalhes por questões de privacidade, mas vamos supor que você gostasse muito de alguém mas esse alguém não largaria um suposto conforto pra lidar com o caos que você é), eu fui para as férias de julho (já com 10kg a mais, nenhuma autoestima e nenhuma roupa que me servisse) disposta a conversar com meus familiares sobre a mudança de curso. eu estava relutante. eles me aconselharam tentar de novo. dessa vez eu levaria as coisas a sério.
a diferença do primeiro para o segundo semestre foi que basicamente eu cortei as interações pessoais que eu antes fazia (meio forçada, meio esperançosa) e comecei a pensar sobre elas enquanto frequentava as mesmas aulas insuportáveis de sempre. eu parei pra ver que todas as conversas, todas as pessoas conhecidas, todas as festas, tudo que eu fiz foi basicamente em vão. tudo era superficial, forçado, vil. eu não sentia mais nenhum prazer em conviver ou simplesmente sair de casa.
houve um tempo em que cheguei ao ponto de hesitar em sair de casa, e quando eu voltava eu chorava. às vezes eu nem esperava chegar em casa pra chorar, chorava no banheiro da faculdade mesmo. eu sabia que eu deveria estar fazendo muito mais pra honrar o que eu prometi pra minha família e pra mim mesma, mas ver meu fracasso me derrubava todos os dias. todos. os. dias. eu costumava me comparar com as pessoas que estudaram comigo no primeiro semestre e pensava 'se eles podem, como caralhos eu não consigo também?'. eu comecei a ficar paranoica e pensar que qualquer um que estivesse olhando pra mim na verdade estaria me julgando em pensamento. multidões me sufocavam, estar em sala de aula me deixava com tontura e calafrios, a voz das outras pessoas ecoava na minha cabeça e me atormentava até a hora de eu ir dormir. tudo era negativo, uma afronta, um ataque a mim. a convivência se tornou quase insuportável, mas eu segurei a barra pra tentar fazer o fracasso ser menor. tentando imaginar o que os outros pensavam, eu ficava transtornada e não conseguia focar no que era realmente importante, ou nem tão importante assim, mas o motivo pra eu estar lá: as aulas.
o fato de não ter um ombro pra chorar, pessoas pra contar (que eu genuinamente confiasse ou com quem eu poderia falar abertamente sobre tudo que eu queria), tirando um grande amigo que sempre, sempre me socorreu e tentou me alegrar de todos os modos, ah, aquilo me matava. pra passar o tempo eu jogava tibia (hehe) e ficava temporadas sem nem comer alguma coisa. eu vivia de leite com nescau, ovo mexido, misto quente. eu comia uma vez por dia e só comia porque a barriga doía. eu emagreci 10 quilos em um mês. minha saúde foi do exagero positivo ao exagero negativo em questão de 3 meses.
das poucas alegrias que eu posso me orgulhar de falar aqui, posso citar treinar vôlei (o time era realmente maravilhoso, as meninas são muito feras e me acolheram como ninguém mais), a primeira república onde morei, que mesmo não dando certo, eu sempre gostei muito das meninas de lá e o apartamento onde eu vivi até eu ir embora de lorena, onde eu igualmente considero muito as minhas ex companheiras de habitação pela paciência comigo e pelo bom tratamento de sempre, e trabalhar na aiesec, uma organização maravilhosa com muita gente competente lá dentro. basicamente esses elementos eram o que me movia na época. o curso em si já não era mais meu sonho, não chegava nem perto disso, na verdade o curso era meu maior pesadelo. 
quando eu pensava em ir pra faculdade, eu começava a tremer e minha temperatura corporal baixava bastante. talvez por causa do ambiente, mas muito mais por motivos pessoais de não conseguir alcançar o que eu desejava. eu simplesmente não conseguia me sentir confortável ou pertencida, mesmo se eu estivesse fazendo tudo certo. eu sempre me sentia um fracasso, uma vergonha, eu sempre me comparava com as outras pessoas e queria fazer o que elas faziam, já que, se elas podiam, eu também podia.
mas a vida não é assim, né? não é sempre que a gente vai conseguir fazer tudo que a gente quer, especialmente se a gente não foi designado pra fazer alguma coisa. é, eu acredito que a gente tem aptidões e que bater na tecla de fazer outra coisa pode ser muito doloroso sim. a minha resposta ao bater na tecla foi muita ansiedade social e o meu segundo maior surto de depressão. foi difícil estar na minha cabeça naqueles momentos.
no fim, tudo deu certo. eu dei por encerrado o semestre me sentindo melhor comigo mesma depois de tomar um tempo pra pensar na minha vida e refletir o que eu priorizava de verdade. eu finalmente havia decidido que eu merecia uma nova chance. um dia isso ia acontecer comigo, e aconteceu: eu tomei uma puta decisão errada, que foi a de tentar engenharia química. eu me iludi por um nome grande, que na verdade não era nada daquilo que eu imaginava. eu me torturei pra tentar me fazer encaixar onde eu jamais poderia pertencer sem um esforço descomunal de descaracterizar a pessoa que eu sou.
tudo isso só me ensinou, e eu sou eternamente grata, a seguir o que tem a ver comigo, nunca mais fazer algo que eu não me sinta bem fazendo e prezar por pessoas que valham a pena. fora isso, eu desenvolvi o senso de individualidade (se eu não fizer por mim, ninguém mais fará) e de responsabilidade e, nos dias atuais, a experiência traumática foi imprescindível pra que eu estivesse levando uma vida normal, adulta, e, finalmente, feliz (até segunda ordem).
se você tem dúvida sobre o que você tá fazendo, não tenha. procure algo que você tenha certeza que é o que você quer. talvez demore um tempo pra você se encontrar, talvez você escolha errado (mas isso é bom porque dá experiência), talvez você tenha que slow down e parar por algum tempo pra pensar no que você quer... mas não se estupre mentalmente tentando algo onde você não se encaixa. conselho de uma engenheira que nunca será, graças a deus.